quinta-feira

A função dos blogs na literatura

A função dos blogs na literatura
por Fernanda de Aragão

Para os conectados, faz tempo que os blogs deixaram de ser um diário virtual, destinado às confissões adolescentes do primeiro beijo. [O dossiê do Luis Nassif contra a revista veja é um bom caso da força que tem um blog; bem como a discussão política e econômica de Noblat e a ciência evolucionista em constante discussão lá no Polegar Opositor]. O fato é que há serviços gratuitos e tutoriais para templates, layouts, recursos adicionais e hospedagens que dão aos usuários, pela facilidade de se montar um blog, o poder da palavra escrita, da opinião, da expressão, do registro e da democracia. Pedro Serra, em entrevista ao Blog do Luiz, foi taxativo: “os blogueiros são formiguinhas com megafone!” E desde então eles arrumaram um ganha-pão. Este novo profissional foge dos contos das carochinhas e em prol de um teor relevante, reflexivo, novo e atraente ao público, deixa de lado o “de onde fui para onde vou” e as listas de supermercado. Com um bom conteúdo, há quem lucre mais de 10 mil reais mensais com a atividade de blogar. Mas é importante não se iludir. Dá trabalho, afinal, ninguém enriquece sem esforço, principalmente com a recessão americana assombrando as bolsas de valores mundo afora. [Estamos em setembro de 2008!].

Por outro lado, a internet vive o movimento WEB 2.0. Trata-se de um movimento colaborativo e está associado ao código aberto. Qualquer usuário pode transformar, melhorar, inserir e modificar uma plataforma, um programa, um software open access. Daí se nota que também está ficando o monopólio de Bill Gates. Embora a Microsoft ainda se mantenha líder, a tendência é questionar, interagir, criar soluções on-line e filtrar o joio do trigo. O mesmo acontece com os blogs, cuja interatividade se dá através de dois instrumentos em específico: a ferramenta de comentários e a ferramenta trackback. A primeira permite que o leitor poste seu comentário acerca do que foi escrito, aproximando-se do autor do texto, da notícia, da idéia, do artigo e do pensamento, originando um debate. Já a segunda permite que postagens alocadas em outros blogs sinalizem as postagens originais através de um link, para que sejam identificadas por redirecionamento, prolongando a discussão nos diversos espaços virtuais, os blogs parceiros. É exatamente isso que possibilitam uma visão diferente para o blog, muito além daquela que se fez origem.

Devido à crescente popularização – em junho de 2008, o Ibope/NetRatings divulgou que mais de 51% dos internautas brasileiros andaram navegando pelas plataformas do wordpress e do blogger/blogspot – hoje já se estuda a influência dos blogs na formação de opinião dos leitores, principalmente sua influência na transmissão da informação midiática e jornalística. Um exemplo é o blog Geración Y da cubana Yoani que recentemente ganhou o Prêmio Ortega y Gasset do jornal espanhol El País na categoria Periodismo Digital: “a la mejor información o narrativa multimedia publicada en Internet”.

É assim que, avassaladoramente, os blogs vão ganhando especificidade. Trabalham em cima de temas específicos, buscam um pagerank elevado e, para isso, escolhem as palavras e a quantidade delas que mais agrade o sistema robótico de buscas do google. É coisa de profissional. É ele que se destaca de todos os outros blogueiros e do crescimento daqueles dois blogs criados por segundo dentro da chamada blogosfera. Este livre se expressar ganhou o mercado, com os blogs corporativos, e a educação, com os blogs pedagógicos. Mas nesta linhagem de blogs temáticos, o que dizer dos blogs literários?

Há por certo uma sombra que não deixa a literatura produzida em blogs emergir. Pelo menos não ganha a mesma visibilidade que outros blogs temáticos, de política, de ciência, de opinião. Talvez porque haja a questão da autoria envolvida no mercado literário e que ainda é tabu para muitos autores e editoras. Vive-se de copyright e um texto publicado na internet torna-se um texto já publicado, num mar de procura por originais. No entanto, a questão dos direitos autorais na internet também já está bem resolvida com a Criative Commons License, aceita legalmente em vários países, inclusive no Brasil. É só o autor selecionar que tipo de licença ele quer para seu escrito e colocar na página um link de aviso. Simples, prático e eficiente.

Mesmo com toda essa ferramenta blog borbulhando pela internet, outros tabus invadem o meio: de que os livros vão acabar, de que liberando o acesso gratuito ao texto, quando este for publicado em papel não haverá quem o compre, que publicando os textos on-line queimam-se eles para concursos literários (isso infelizmente é verdade) e blá-blá-blá e coisa e tal. E talvez seja pelo conjunto disso tudo que faz com que os autores já publicados utilizem seus blogs como um diário de bordo, uma agenda de eventos, como nos primórdios. Um retrocesso.

Talvez seja por uma falta de conhecimento, ou falta de outras coisas, que autores como Clarah Averbuck [leia também A Cerveja Escarlate] preferem excluir a ferramenta de comentários de seus blogs contrapondo-se ao mundo real da cubana Yoani que ao gerar mais de 3 mil comentários em algumas de suas postagens, agrega jovens do mundo todo, ávidos por discutirem seus ideais sociais, econômicos e políticos. Enquanto um vive de ser uma cigarra gritando em cima do muro, a outra é a tal da formiguinha com o megafone.

Há de se pensar novas estratégias para os blogs literários, que caminhem para além de ser um diário tipo Bruna Surfistinha. Se ainda encaramos a literatura como algo erudito, destinado para poucos, há, de fato, pouco espaço para ela na internet. Se ao contrário, acreditarmos que a palavra tem um força para além, a literatura original, feita de instante, não pode fugir aos blogs, ao olhar do outro, principalmente neste momento WEB 2.0 em que se constitui um modelo hibrido de interface entre os blogs e os sites (uma alusão às revistas literárias que se proliferam ciberneticamente, mantendo-se o ciclo fechado das editorias).

Um último dado: a profissionalização dos blogs permite que os autores façam parcerias com livrarias, editoras, lojas de departamento e por aí vai. O programa de afiliado do Submarino para professores, por exemplo, paga 10% preço de capa por cada livro vendido através de um blog parceiro. Quanto é mesmo que ganha um autor? Os mesmos 10% preço de capa. A monetização nos blogs e sites é uma realidade e está aí para ser explorada. Diz o google que para se aumentar o pagerank das páginas e dos blogs, e com isso ganhar mais visitantes e, consequentemente, aumentar as vendas em programas afiliados, é necessário que os donos de blogs escrevam conteúdos originais [o ctrl-c, ctrl-v geralmente não é bem visto]. Ou isso, ou o blog perde sua potencialidade. Não seria o caso de a literatura explorar melhor esse nicho?

Por que não é fácil manter um blog de qualidade na internet? 

Em setembro de 2008 saiu a 5ª edição do State of Blogosphere, estudo do sistema Technorati, especializado em blogs. A pesquisa traz como principal indicativo que o ato de blogar não atinge apenas aos mais jovens, principalmente na América do Norte e Europa. O crescimento é, de fato, espantoso. No entanto, dos 133 milhões de blogs registrados no sistema, apenas 5,5% (7,4 milhões) foram atualizados nos últimos 4 meses. Dado que reforça a idéia de que nem tudo que reluz é ouro, principalmente a função democrática da internet.

Uma formiguinha com megafone trabalha. A pesquisa ainda indicou que 45% dos blogueiros consultados passam mais de 5 horas semanais cuidando de suas crias. 12% do total chega a passar 20 horas semanais. É importante observar que um maior tempo dedicado ao blog também se reflete em uma maior autoridade/visibilidade na blogosfera: blogs tops no ranking do Technorati têm uma média mensal de 310 posts, contra 125 dos que ocupam as posições entre o 101º e o 500º. [Coitado deste Cinco de Outubro!]. O Technorati aponta ainda que os blogueiros com maior autoridade usam mais tags – palavras-chaves de indexação para a postagem, disponíveis em diversos sistemas de buscas de informações em blogs – e fazem abordagem com assuntos relacionados ao noticiário, o centenário de Machado de Assis, por exemplo.